Cidade pequena é uma coisa boa demais da conta! Todo mundo te conhece, mesmo você não conhecendo todo mundo! Em meados de fevereiro, tive que levar o meu pai ao pronto atendimento aqui de Pedro Leopoldo – sequelas de uma forte Covid. Na sala de espera, uma senhora o cumprimenta, vira para mim e pergunta: “Você é filho da Dona Martha, não é”? Diante da resposta positiva, ela me conta o seguinte caso: “Sua mãe foi professora das minhas duas filhas, elas gostavam muito da sua mãe. Aliás, Dona Martha ajudou muito as minhas meninas. Uma delas, muito estudiosa, sofria bullyng na sala de aula e quem ajudou e resolveu o problema foi a sua mãe. Minha filha estudou, se formou e hoje é uma enfermeira realizada na vida”!
Melhor do que a gente falar sobre as nossas mães é o depoimento das pessoas que conviveram com elas. Mamãe foi professora e diretora em escolas públicas por trinta anos. A maior parte de sua vida em Vera Cruz de Minas, um distrito da nossa cidade, com uma grande comunidade carente e vários problemas sociais. Na minha infância e adolescência, nossa casa ficava cheia de crianças nos finais de semana. Era mamãe, ensinando os seus alunos – de forma gratuita, claro – que estavam com dificuldades na matemática e na biologia.
Muitos deles lá tomavam o café da manhã e almoçavam. Alguns passavam o dia. Afilhados e afilhadas foram aos montes. A lista de presentes nos aniversários e dias das crianças era extensa! Mais do que caridade, mamãe gostava das pessoas e tinha uma coisa que está cada vez mais rara nos dias atuais: consciência social. Ela não queria apenas ensinar matemática ou dar o pão a quem tinha fome. Lutava pela mobilidade social dos seus alunos através do estudo e ficava extremamente feliz quando alguns deles conseguiam ingressar em uma faculdade e conquistar um diploma de curso superior. Brigou muito para que as exceções se transformassem em regras!
Quanto a mim, o seu maior legado foi me ensinar a tomar gosto pela leitura. Desde criança, com livros e revistinhas em quadrinhos. Filho único, o meu maior passatempo, depois do futebol, era ler. E depois escrever. Ah, como seria bom se todos tivéssemos um professor nas nossas famílias para nos ensinar as maravilhas que são os livros e quanto estes nos despertam e nos levam a um mundo novo e diferente! Mundo do conhecimento e da capacidade de reflexão, essencial nos dias atuais de comunicação rápida e baseada no senso comum. Eu posso afirmar que tive esse privilégio!
Sinceramente, acho que não existe profissão mais bonita e importante do que a de um (a) professor(a). É onde tudo se inicia, com a formação e aprendizagem dos (as) nossos (as) futuros (as) cidadãos(ãs). Fico imaginando a emoção de se ver a evolução de uma criança. O aprender a ler e a desenvolver as suas próprias ideias e pensamentos! E a emoção de se reconhecer como agente participante e transformador de todo esse desenvolvimento! Mamãe também foi uma privilegiada!
Bom, hoje minha mãe já não se encontra aqui nesse plano. Partiu como tinha que partir: ao lado do seu único filho, que sofreu muito, mas entendeu que havia chegado a sua hora e que ela já tinha deixado a sua contribuição para os que com ela conviveram. Para mim, o ensinamento foi justamente o da preocupação com o próximo, da empatia e da luta contra essa desigualdade e exclusão social absurda do nosso país. E que a educação e a cultura são transformadoras e libertadoras de toda uma sociedade. Ah, mas vocês podem me perguntar: Matheus, afinal de contas, sua mãe não tinha defeitos? Certamente muitos, mas não para mim, pois, minha mãe era e é como as outras; uma heroína para os seus filhos!