Texto de Daniel Francisco da Silva*
És então tu a Cobra Verde, da terra do meu pai? Vieste aqui parar, talvez como eu, fugida de tanta guerra, não é?, pergunta ela em voz alta, pois tem a estranha sensação de ser entendida pela Cobra (MOMPLÉ, 2008, p. 23)
Minha irmã ligou para mim naquela tarde, querendo saber notícias minhas a pedido de nossa mãe. Eu e minha filha caçula viajamos para São Paulo e fiquei um pouco febril e indisposto. Não foi nada sério, provavelmente uma virose. Ao explicar isto, minha irmã emendou que mamãe também tinha se sentido mal, mas no caso dela era “cobra verde” – segundo “diagnosticou” a médica dela.
Minha mãe acabou de completar 89 anos de vida no último 21 de abril e parece que se impressionou com a data. Emocionou-se mais do que o normal com ela. Raymunda, como ela se chama, é quase uma estoica da região de Sobrado (vizinha de Dr. Lund e das terras da Fazenda Busca Vida). Nunca reclama de dor e criou os nove filhos com resignação. Não precisou de Epicuro para saber desde cedo que não se deve temer a morte e que toda dor deste mundo é suportável.
Com o passar dos anos, porém, foram se encantando os amigos, irmãos e a fecundidade dos anos tem lhe assombrado um pouco.
Jack, aquela minha irmã do telefonema, levara mamãe ao médico, que em palavra que mineiro entende, “disse que não é nada; continue com os remédios, alimentação mais espartana, pois não tem nada além dos anos de vida. Ela tem é cobra verde”.
São assim as relações muito próximas. Ambos ficamos doentes. No meu caso um mal-estar e no caso dela uma doença psicossomática, ou seja, de fundo psíquico e ligada à idade. A expressão cobra verde é uma expressão popular de alguém que pensa que está mal, mas recebe uma boa notícia!
Mãezinha querida, desejo-lhe sonhos, alegrias e que possamos viver intensamente o hoje ao seu lado. Te amamos.
*Daniel Francisco da Silva é professor e advogado do Estado de Minas Gerais