A Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) entrou na Justiça com uma ação de danos morais coletivos contra o ICMBio, órgão federal de proteção ambiental que embargou as obras e acabou inviabilizando a instalação da fábrica da Heineken em Pedro Leopoldo.
A Fiemg não comentou o assunto e, assim, algumas questões ficam adiadas como o fato de que a cervejaria holandesa se comprometeu a fazer o investimento em outra cidade de Minas Gerais – investimento de R$1,8 bilhão para o qual mais de 200 prefeituras já se credenciaram.
Já que não haverá prejuízo para o Estado, por que cobrar danos a uma cidade em especial, se a Fiemg representa toda a indústria mineira? Em segundo lugar, qual seria o valor da indenização? Na ação inicial, a Fiemg calcula uma perda anual de 119 milhões em impostos municipais – correspondente a quase 50% do PIB de Pedro Leopoldo. Como cobrir este prejuízo para a cidade, além das milhares de vagas de emprego frustradas?
A prefeita de Pedro Leopoldo, Eloísa Helena (MDB), afirmou que, como já disse em várias ocasiões, fui surpreendida com a decisão da Heineken em não se instalar no município, embasada no embargo do ICMbio.
“Sabemos dos inúmeros prejuízos decorrentes desta decisão para Pedro Leopoldo e região. Diante disso, apoio qualquer ação para beneficiar os pedro-leopoldenses, incluindo as que solicitem ou incentivem a reversão da decisão da empresa, pois entendo que a área pretendida em nada traria os prejuízos para o meio ambiente que foram divulgados”, disse a prefeita.
Eloísa Helena, que é advogada, também destacou o fato de que a ação visa uma reparação de danos morais e que uma possível condenação será destinada ao Fundo Estadual, na forma como requerida na Inicial.
A atitude da Fiemg também levanta outras especulações. “Ela pode estar olhando para futuras oportunidades de investimento no Estado e marcando posição quanto à segurança jurídica que tais investimentos demandam”, imagina o empresário Emiliano Braga, um dos líderes do movimento #euqueroaheinekenaqui que, desde o embargo das obras em setembro, empenhou-se pela continuidade do empreendimento na cidade.
“Pelo critério técnico, não havia o menor problema. Inclusive a cervejaria e o Ministério Público caminhavam para um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) que garantiria a instalação do empreendimento e, ao mesmo tempo, a proteção do patrimônio natural e arqueológico da região”, garante Braga.
O empresário lamenta a publicidade negativa promovida por movimentos ambientalistas que eram contra a instalação da cervejaria em Pedro Leopoldo. “Eles acabaram sensibilizando pessoas que não eram da cidade e não conheciam a realidade local, além de afugentar a empresa, que se sentiu premida por esse desencontro de posições quanto à sua presença no município”, aponta Braga.
Para ele, vai ser difícil recuperar o que a cidade perdeu. “O que perdemos primeiro foi a esperança, a possibilidade de ativar um novo ciclo industrial. Até porque a Heineken só iria começar a produzir daqui a dois anos”, diz o empresário. “Além disso, a arrecadação direta relacionada aos tributos municipais poderia aumentar cerca de 50%, em uma primeira análise, suficientes para construir um teatro, grandes avenidas interligando os bairros com a cidade, um mercado do produtor e um museu da cidade para receber turistas do mundo inteiro que viessem conhecer o nosso patrimônio natural e arqueológico”, assegura.
Na ação civil, assinada pelos advogados Thiago Gomes de Carvalho Pinto e Mariana Barbosa Saliba Moreira, a Fiemg reitera sua missão de defesa dos interesses da indústria mineira. E, por esta razão, considera legítimo o ajuizamento da medida judicial para reparar dano coletivo e corrigir direitos que foram diretamente afetados “por ato ilegal por parte dos técnicos do ICMBio” ao embargar a obra de fábrica da Heineken.
Entre outros argumentos, a Fiemg alega que o licenciamento foi autorizado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente à luz da legislação vigente e foi obstado de forma abusiva e ilegal pelo ICMBio, que não tinha competência para tal. Para a entidade, a atitude do ICMBio gerou impactos econômicos e sociais incalculáveis e irreversíveis não só para Pedro Leopoldo, mas também para a grande Belo Horizonte e todo o Estado de Minas Gerais.
A estimativa da Heineken era de produzir 7,5 milhões de hectolitros por ano (750 milhões de litros) de cerveja, com o potencial de elevar em 4,8% a produção nacional, ou o equivalente a R$ 1,6 bilhões de faturamento por ano. Neste contexto, a Fiemg calcula que Pedro Leopoldo perdeu, com a desistência da Heineken, 119,2 milhões anuais em impostos líquidos, mais de 2 mil empregos diretos e indiretos e um aumento na massa salarial do município de R$ 164,1 milhões.
Em dezembro do ano passado, a Fiemg já havia adiantado que estudava a possibilidade de processar o ICMBio pelo embargo da cervejaria em Pedro Leopoldo. Na ocasião, o presidente da entidade, Flávio Roscoe, criticou os ambientalistas. “Pequenos grupos se apropriam dessa temática ambiental e criam uma retórica, aí fica difícil para uma empresa, porque, com a energia que elas vão gastar, preferem ir embora…. As 64 mil pessoas da cidade (referindo-se a Pedro Leopoldo) estão condenadas a trabalhar em Belo Horizonte, piorar o trânsito e a impactar o meio ambiente”, disse Roscoe, em entrevista coletiva.
Para o ambientalista Gustavo Gazzinelli, do Instituto Diadorim, a ação da Fiemg “é uma atitude de assédio moral à missão do ICMBio e, consequentemente, dos seus servidores, que cumprem essa missão”. Já a assessoria de imprensa do ICMBio informou que o instituto ainda não foi notificado formalmente sobre os termos da eventual ação judicial impetrada contra a instalação da fábrica da Heineken na Área de Proteção Ambiental (APA) Carste de Lago Santa. Em resposta enviada ao Diário do Comércio, o ICMBio aponta que “a análise técnica realizada e enviada ao órgão ambiental licenciador constatou uma incompatibilidade do empreendimento com o Plano de Manejo da Unidade de Conservação, não sendo possível a continuidade do processo”. (Com matéria publicada no Diário do Comércio)