Conversando ao telefone com um amigo esta semana – e há atualmente outra maneira de conversar com os amigos que não seja essa? – segredei: minha Coca-cola está acabando e você sabe, eu não vivo sem coca-cola. Ele ironizou: e você nunca teve tanto medo de comprar uma coca-cola, né?
Estava certíssimo. Antes que meu estoque acabasse, saí de casa, de carro, na tardinha de sábado. Pedi por telefone ao Beto do Frango o que precisava: leite, uma vela para filtro, pilhas, batatas, bananas e, naturalmente, frango e coca-cola. Parei em frente ao armazém e ele me trouxe as compras; com elas, a maquininha para passar o cartão.
O caminho até lá foi uma experiência amedrontadora, de quase pânico: eu tremia, meu coração palpitava, enfim, as ruas vazias da minha cidade nunca pareceram um lugar tão perigoso. A sensação, inequívoca, era a de que uma bomba atômica tivesse explodido e o ar estivesse irreparavelmente contaminado.
Não havia ninguém na rua, ou sequer nas portas ou janelas das casas. Como se, trancadas em casa, ao abrigo do céu e do sol, as pessoas estivessem a salvo desse coronavírus maldito, que nos tirou a cerveja no passeio do bar, o abraço daqueles que amamos, a conversa olho no olho, a comemoração e a despedida.
Sabemos que o vírus contagia pela proximidade, ou seja, não haveria o menor problema em sair andando sozinho pela rua principal ou em conversar com o vizinho a uma distância segura. O problema é se todo mundo tiver a mesma ideia, já que a Covid-19 se espalha e se multiplica em meio a multidões. E quanto mais próximos estivermos um do outro, mais risco corremos, em especial aqueles para quem o risco é mais real.
Enfim, se muitos ganharem a rua seja por que motivo for, a aglomeração estará formada e o perigo será real e imediato, como em um velho e bom filme de Harrison Ford. Melhor voltar para casa mesmo e, se for possível, ver o filme. Mas antes de ligar a TV, lavar as mãos, os braços e o rosto com água e sabão. E para garantir, esfregar um pouco de álcool em gel: seguro, morreu de muito velho.