Por Raquel Faria para Os Novos Inconfidentes
A histeria política em torno da troca do ministro da Saúde não tem razão de ser – como de resto toda a polarização que domina a agenda do combate à covid. Nelson Teich pode fazer trabalho melhor que Mandetta e agradar tanto à opinião pública como a Bolsonaro se tiver no cargo uma postura ao mesmo tempo técnica e sóbria. Falar menos e agir mais. Além disso, apesar da supervalorização do ministério pela mídia, o combate à covid depende menos do ministro de plantão e muito mais do prefeito e do governador, que são os executores das políticas de saúde.
Desde os tempos de José Serra, que reorganizou a saúde pública no governo FHC e foi um dos melhores ministros da área, o sistema funciona de modo descentralizado. O ministério tem o papel de articular programas nacionais, além de gerir o repasse de verbas, que ocorre segundo critérios de distribuição técnicos e predefinidos. Mas as ações são executadas nos municípios com suporte dos estados. Não há estrutura ou equipamento de saúde sob responsabilidade da União; postos, centros e hospitais são administrados por governos municipais e estaduais. Não muito diferente do que ocorre na educação.
O SUS roda no piloto automático, basicamente, tocado por uma burocracia especializada ao longo de anos e com imunidade em seus cargos. Por isso o sistema tem mostrado tanta estabilidade, conseguindo se manter e até mesmo crescer, apesar de todas as turbulências políticas e econômicas no país.
Na atual pandemia, os papeis dos governadores e prefeitos ainda foram reforçados por decisões no STF, delegando a eles o poder de definir medidas de isolamento social e outras ações de prevenção e controle. O presidente pode tentar boicotar ou atrapalhar mas não têm como barrar a política de quarentena em curso na maioria das cidades por opção de seus governos locais e moradores.
O cidadão também tem papel fundamental. E o desempenhará melhor se, em vez de tomar parte no fla-flu histérico e ideologizado sobre ministros, quarentenas e cloroquina, cumprir direito as regras de prevenção e acompanhar de olho arregalado as ações do governador do estado e, principalmente, do prefeito de sua cidade. No sistema brasileiro, eles é que mais fazem acontecer. Ou não.
No combate ao coronavírus no Brasil, intriga a quantidade de bobagens e inverdades por todo lado. Há uma pandemia paralela de desinformação, manipulação e preconceitos E essa, sim, parece fora de controle no país.